segunda-feira, 30 de novembro de 2009

Bizarros paradoxos

Original publicado em 23 de setembro de 2007. Nada mudou de lugar.


O poder de Estado, que parecia planar bem acima da sociedade, era todavia, ele próprio, o maior escândalo desta sociedade e, ao mesmo tempo, o foco de todas as corrupções.
Comuna de Paris, 1871
A desfaçatez se acentua.
O País foi capturado.
O Estado oferece mal-estar.

A Ética se contorce na dialética.
Os Tres Poderes estão sintetizados em um.
A política virou alojamento de velhacos.
A religião, de oportunistas.
A oposição perdeu o prefixo.
Operário ora é patrão.
E o patrão, mero capacho.

Os partidos procedem a partilha anatômica.
A contaminação criminal é atômica.

Ladrões de bancos agora os dirigem.
Nomeiam os embaixadores aqueles que os sequestravam.
São Paulo é nome de portaviões, vaso de guerra.

A lei é do mais forte; mas
o exército não é o nosso forte.
A universidade está a serviço de quem a domina.
As academias emitem conceitos ideológicos, metafísicos, fragmentados,
não compatibilizados, mas compartimentalizados.
A alfabetização é prioritária; a leitura, não.
Português requer precisão, mas viver não é preciso.
A matemática é usada em má temática.
As ciências humanas enveredam pela ladeira da ilusão.
A história é tecida com estórias.
A antropologia supõe-nos andróides.
A psicologia embreta.
A imprensa não pensa.
No esporte nada se faz por esporte.
O Botafogo esfria.
O circulante permanece contido.
A res publica ora é privada, e muito fedorenta.
A economia nada produz.
O marketing vende gato por lebre.
Propugna-se por Justiça! Ninguém é capaz de defini-la.
O tribunal faz mal; e o direito virou torto.
A medicina só mede.
As medidas são desmedidas.
A química desconhece a alquimia.
A física se restringe à educação.
De gravidez todos entendem; da gravidade, ninguém.
A sociologia ignora o indivíduo.
A psiquiatria não explica a alienação social.
A filosofia não cogita; só copia.
Brasília terá sério Congresso:
Está marcada a realização do I Congresso dos Palhaços Brasileiros. O encontro é de iniciativa dos deputados Paulo Rubem Santiago (PDT-PE), Carlos Biffi (PT-MS), João Matos (PMDB-SC) e Edgar Mão Branca (PV-BA). www.claudiohumberto.com.br,
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Feliz aquele que ainda esperança pode ter,
De desse mar de equívocos emergir!
O que não se sabe, é o que mais se precisou saber,
E do que se sabe, não se pode mais servir.
Fausto, à Wagner, por Goethe.


domingo, 29 de novembro de 2009

A impressionante quadrilha de Brasília




O poder de Estado, que parecia planar bem acima da sociedade, era todavia, ele próprio, o maior escândalo desta sociedade e, ao mesmo tempo, o foco de todas as corrupções. Comuna de Paris, 1871
Nenhuma gota d'água passa pelo esgoto sem se tornar poluída. ROBERTO JEFFERSON, presidente do PTB
Todos órgãos de imprensa hoje divulgam uma série de vídeos e gravações da Polícia Federal dando conta de impressionante cifra, em dinheiro sonante, sendo distribuída por ordem do elemento que manda no Distrito Federal. São maços e maços que os asseclas colocam em bolsos internos e externos, e ainda por dentro das meias, mercê do grande volume.
Mulheres chegam com avantajadas bolsas. Inúmeros beneciados paulatinamente aparecem nas telas dos lares. O chefe-da-quadrilha, o Idiota imperfeito., era "líder" do ex-presidente Cardoso, 
Há riqueza ostensiva em Brasília que não poderia ser construída honestamente. Casas suntuosas de servidores e ex-servidores que acumularam patrimônio incompatível com a realidade salarial... Parlamentares agradecem a Deus pela propina, numa cena inacreditável. RABELLO, J.N., É só o começo. - Estadão de São Paulo, 30/11/2009
Houve quem lembrasse do golpe peruano. A descoberta daquela falcatrua levou à cela Montesinos e Fujimori, este pioneiro em alterar a constituição em prol da reeleição.Por acaso o nipônico era muito amigo de nosso presi dente da época.
Parece inequívoco o modo como foi "legitimada" a permanência do professor Cardoso por mais quatro anos no mar-de-lama que ele e seu staff produziram. Um a um tem caído as máscaras dos coadjuvantes - Marcos Valério, Lucas Lopes, presidente do Banco Central, e agora, de novo, o seu "lider" no congresso.

Infelizmente, a capital do Brasil não produz vigilantes… Uma epidemia de cumplicidades tomou conta daquele silencioso e distante planalto. Ali só se ouvem murmúrios e sussurros. Conversas sempre cifradas. Personagens que se empenham em esconder o que pensam e o que fazem. Caras de anjo que enganam caras de pau e caras de pau que fingem estar sendo enganados… O fato é que esse presidencialismo caudilhesco, pelego, sindical, oligárquico e imperial, vigorando há tantos anos, é que cria todas as condições e fornece todas as ocasiões. Depois, providencia as desculpas. CAVALCANTI, Prof. Sandra, Caras de anjo enganam caras de pau
Surpreende a parcimônia generalizada com a abjeta performance dos artistas, ainda mais porque flagrante. Neste caso em tela há quem judiciosamente indique um processo, o qual, em caso de culpa, penalizaria o governeiro. A OAB sugere um processo de Impeachment. No comando da OAB-DF está o adv. Fran cisco Ca puto, cujo escritório atua em favor de Arruda em vários outros inquéritos contra o governador. O partido no qual o meliante é filiado também deu sustentação aos grandes golpes perpetrados no governo do socio logo, e ajudou a abafar o grave desfalque perpetrado no Rio Grande do Sul pela governadora, do psdb . Ora diz que estuda o desligamento do pilantra:
A direção do Democratas agendou para amanhã à tarde um encontro com o governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda. 'Eu disse a ele (Arruda) que precisamos de provas, fatos, argumentos', disse o presidente do DEM senador Demostenes Torres. Folha de S.Paulo, 29/11/2009
O presidente nacional DEM, deputado Rodrigo Maia (RJ), disse ao Estado de S.Paulo que Arruda deverá divulgar uma nota explicando sua situação política. Ah tá:
Arruda ameaça DEM e tem expulsão adiada
Governador do Distrito Federal se nega a sair por mensalão e adverte partido que contará o que sabe
.

Trata-se de um caso gravíssimo, em que se exige reflexão e ação imediata de todos os setores responsáveis. Mas o Judiciário tem feito sua parte. O STF e o STJ (Superior Tribunal de Justiça) podem dar celeridade aos processos com a convocação de juízes para atuarem como juízes instrutores, por exemplo. Não se trata de algo incólume. O processo segue o rito normal.
GILMAR MENDES, Presidente do Sipremo Tribunal Federal. Estadão, 1/12/2009
O Judiciário tem sido ótimo coadjuvante do torpe processo. Infelizmente.
A decretação de Impeachment visa abreviar o sofrimento do povo. Dessarte, não lhe é apropriado nenhum processo, seja legislativo ou judicial. Trata-se de medida emergencial, de segurança. Cautelar. De efeito imediato. O instrumento não visa penalizar, mas afastar, em caráter preventivo, por salvaguarda, qualquer suspeito de ato ilícito, que dirá em flagrantes desta proporção e clareza. É um ato jurídico, muito acima de político, reitero, não um processo. E como tal, deveria ser da alçada de qualquer Tribunal Federal, isento par excellence. A quantidade de provas em mãos da Polícia Federal é estarrecedora. Não resta nenhuma dúvida, tampouco justificativa plausível. A melhor solução é a hondureña - não deixá-lo sequer descer do carro, nesta segunda-feira. O que o canalha chantagista poderá mais fazer se mantiver a chave-do-cofre?
Está marcada para o próximo dia 10 dezembro, a realização do I Seminário dos Palhaços Brasileiros. O encontro, de iniciativa dos deputados Paulo Rubem Santiago (PDT-PE), Carlos Biffi (PT-MS), João Matos (PMDB-SC) e Edgar Mão Branca (PV-BA). www.claudiohumberto.com.br, 29/11/2009
Merecemos.
Ou se acaba com a hipocrisia, ou o Brasil entrará numa guerra de todos contra todos.
A corrupção é a culpada pela miséria do nosso país, pela falta de hospitais, pela falta de remédios, pela falta de escolas, pela falta de merenda, pela falta de saneamento, pela falta de rodovias, pela falta de cultura, pela violência, pela falta de luz, pela falta de água, pela falta de casas populares, pela falta de emprego, pela falta de investimentos, pela seca no Nordeste, pela miséria no Norte e Nordeste do país, pelas queimadas da Amazônia, pelos garimpos ilegais nas em Roraima, pelas derrubadas ilegais de árvores no país, pelo tráfico de armas, pelo tráfico de drogas, pelo roubo de cargas nas estradas federais, pela entrada de armas e drogas no país pelas nossas fronteiras, pelo sem número de projetos a serem aprovados no Congresso há anos e que não saem do papel, pela roubalheira do Senado, pelo empreguismo do governo federal, que desde que assumiu quadriplicou o numero de funcionários na folha de pagamento... A corrupção é a mãe de todos os crimes.
FERNANDES, Ana Lucia Martins, O Globo, 15/12/2009.
Foto: Estadão..........................
Diante da leniência das autoridades, o povo já ensaia a revolta.
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Não perca:
A inexorabilidade da verdade







Final de torcidas trocadas

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O campeonato brasileiro de futebol reservou uma
decisão de
photochart à quadra de competidores.


Pos.ClubePGJVGPGCSGAPR.
FLAMENGO/RJ64371856431357.7%
INTERNACIONAL/RS62371861431855.9%
PALMEIRAS/SP62371757431455.9%
SÃO PAULO/SP62371753421155.9%
CRUZEIRO/MG5937175652453.2%
ATLÉTICO/MG5637165553250.5%
GRÊMIO/RS55371566442249.5%
GOIÁS/GO5437156263-148.6%
AVAÍ/SC5437146052848.6%
10ºCORINTHIANS/SP4937134754-744.1%

Última rodada
.
371 38ª 6.12-Dom 17:00 - HB São Paulo SPAlinhar ao centro

Sport PE Morumbi São Paulo 3



372

17:00 - HB Santos SP

Cruzeiro MG Vila Belmiro Santos 3



373

17:00 - HB Barueri SP

Atlético PR Eduardo José Farah P. Prudente/SP 3



374

17:00 - HB Coritiba PR

Fluminense RJ Couto Pereira Curitiba 3



375

17:00 - HB Internacional RS

Santo André SP Beira-Rio Porto Alegre 3



376

17:00 - HB Flamengo RJ

Grêmio RS Maracanã Rio de Janeiro 3



377

17:00 - HB Vitória BA

Goiás GO Barradão Salvador 3



378

17:00 - HB Náutico PE

Avaí SC Aflitos Recife 3



379

17:00 - HB Atlético MG

Corinthians SP Mineirão Belo Horizonte 3



380

17:00 - HB Botafogo RJ

Palmeiras SP João Havelange Rio de Janeiro 3




Por concentrar os dois teams que estão liderando o certame, o campeão deve sair do Maior do Mundo. Pelo saldo de gols, e uma combinação exata de resultados os paulistas ainda podem surpreender, mas a hipótese é remota. Curiosamente, também está reservado ao Maracanã uma manifestação de torcidas totalmente inédita, às raias do bizarro: a totalidade dos torcedores do Grêmio estará envergando jaquetas com o escudo flamenguista, pois caso seu time prevaleça, poderá estar entregando o título de campeão ao arqui-rival coestaduano, o S. C. Internacional. Seria muito engraçado o rival entregar a ambicionada faixa ao detestável vizinho.

O quadro surreal ficará completamente aviltado quando os torcedores colorados desembarcarem no Rio com o escudo do Grêmio em vermelho e branco, onde encontrarão com mesmo tom os batalhões do Vasco, Fluminense e Botafogo, os dois últimos engalfinhados na periferia do buraco-negro da segunda-divisão. E de São Paulo ainda vem palmeirenses e sãopaulinos, interessados diretamente na performance gaúcha.
"Vou torcer pelo Inter, que chegou quietinho e conquistou bons resultados. Tem ganhado sem nenhum tipo de conforto", disse o superintendente de futebol do São Paulo, Marco Aurélio Cunha.
Da outra parte, o Corinthians hoje entregou o jogo para o Flamengo, porque isso impediria a ascenção dos rivais paulistanos - Palmeiras e São Paulo. O keeper do Parque S. Jorge deixou o dragão carioca se refastelar em seu próprio reduto.
A imprensa exulta. O material é farto. Renderá uma semana de polêmica. Há quem já diga que o Internacional oferecerá um bicho-extra para o conterrâneo se empenhar.
O Grêmio FPA está no centro do furacão, momento extremamente embaraçoso. O clube do Olímpico não tem mais chances, nada ambiciona, mas também não quer ver a consagração do inimigo máximo. Seu elenco é profissional, todavia, como de todos. Não poderá sua direção encaminhar o pedido da sua torcida aos seus jogadores, evidentemente. Ademais, existem gremistas tão ferrenhos que não admitem o time entrar para perder, ainda que sua vitória represente a glória adversária. Restará a direção, talvez, dar férias antecipadas à sua formação principal, jogando no palco uma equipe mista, com categorias de base. Ainda assim a diretoria enfrentará o dilema, e rezará para que não se confirme nenhuma dessas duas hipótese:
1) Que o esquadrão de aspirantes não seja tão feliz a ponto de derrotar o C.R. Flamengo, dando o título ao S.C. Internacional.
2) Que a inexperiência, a inexorável falta de conjunto de sua equipe, a discrepância de técnica, e o eco do pedido da sua própria torcida, em contraste com o embalo e a pujança do clube da Gávea, ainda mais com o estádio repleto dos urubús, precipite uma derrota por vexatório escore.
A Sociologia, a Antropologia, o Direito, a Economia, a História, talvez Freud, quem poderá explicar?

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Da faina pela Ciência - Final


As conseqüências do analfabetismo científico são muito mais perigosas em nossa época do que em qualquer outro período anterior.
SAGAN, C., O Mundo Assombrado pelos Demônios: 21
Um dos motivos mais fortes que levam os homens à arte e a ciência é fugir do dia-a-dia, com sua crueza dolorosa e sua melancolia inconsolável. Esses homens fazem do cosmos e de sua construção o pivô de sua vida emocional, para encontrar a paz e a segurança que não conseguem encontrar no estreito torvelinho da experiência pessoal. EINSTEIN, A., Idéias e opiniões. Nova York: Random House, 1954
Se não nos perturbasse o pavor dos fenômenos celeste e da morte, algo que nos toca de perto, e se não perturbasse o desconhecimento dos limites dos prazeres e das dores, não teríamos necessidade da ciência da natureza. EPICURO, 341 a.C
SEJA PARA AMENIZAR as agruras terrenas, ou se precaver diante do fatídico sobrenatural, ainda antes dessas famosas priscas eras a raça humana buscava a verdade, o conhecimento; no entanto, até hoje pessoas primam por colher e oferecer apenas ilusões.
.
A vida em si também parece caminhada sem finalidade, desproposital, ou pior ainda, com um fim lamentável, o fim da matéria, a sete-palmos. Dessarte recrudesce a angústia, e com ela se avolumam as intempéries, revigoradas por retroalimentação..
De fato, a vida, a busca pela verdade, e uma técnica a melhor estada podem ser apreciadas por obtusos viéses, mais salientes em flagrantes sociológicos, coletivos, mas para olhar pelo Hubble basta apenas um par de olhos. Quero dizer que a civilização prefere se valer de quem porte qualquer telescópio, em vez dela própria mirar. Acredita que o portador seja capaz de decifrar a metafísica, e bem traduzi-la.
A ciência é um fenómeno social e, como tal, é delimitada pelos benefícios e malefícios que possa causar.Aquilo que se chama crise da ciência não é mais do que esses senhores estarem a começar a ver por si mesmos o caminho errado a que foram conduzidos pela sua objectividade e pela sua autonomia. HITLER, Adolf, cit. HOLTON, Gerald, A cultura científica e seus inimigos. Lisboa: Gradiva, 1998: 46
Atraída pelos contos ao engano, aos equívocos de avaliação, ela se prostra, torna-se descrente, inconfessadamente cética, e não poucas vezes até hipócrita.
Assim pode-se cogitar prudente não dar mais bola a ninguém, e tratar de usufruir a vida como se puder - afinal a controvérsia é tamanha que uma anula a outra, de maneira que 0 x 0 com assistência ou estádio vazio dá no mesmo. No fim das contas, a ciência não cabe a cientistas? Quem produz mateus, que os embale. Ao povo recai produzir comida, que é escassa. Ciência já se tem demasiada, tanta que a maior parte dela se recicla, e o restante é jogado fora. Se satisfeito o numerário, sair para uma praia, um parque, de preferência bem acompanhado, a qualquer som agradável, não tem erro. Let it be. Concordo. Muitas vezes assim agi, e a rigor não me arrependo. O vinho gabaritado, traçar planos de viagens, um cinemascope (quack), uma festa, a sensação do voo em asa-delta são infinitamente mais prazerosos do que a teimosa persistência num rastro visto monocromático, ate obssessivo, geralmente nebuloso e igualmente infinito.
DESCARTES inverteu o circuito. Tomou curto-circuito. Na juventude, ensimesmado questionava. Ao nascer o ciso, o jovem Cartesius partiu à Meditação Primeira, uma meditação deveras primária, a qual não evoluiu sequer um palmo à frente de seu avantajado nariz. Quiçá por isso até hoje cogitar suporte conotação de engano: - Ah, pensei que era assim.
Antes de integrar a soldadesca de Nassau, o ex-filósofo atravessou o Rubicão. Visava deixar suas dúvidas no colo dos insensatos. Discurso sobre o método, justificava o desatino: a decepção com a Filosofia, cujos ingredientes considerava confusos, obscuros e nada práticos. Por irônico paradoxo, ao remeter seu decantado cogito ao quinto-dos-infernos, sob as bênção de DEUS, o franco deixou também de ser. A avalanche de metonímias contrapostas estressara o francês. Sem mais titubear, o loquaz peregrino procedeu a autoexumação para introduzir em sua mente, e em tudo o mais, milhares de estacas numeradas como prerequisitos à certeza. Obstinado pela própria existência, o destemido do Loir retirava dos seus neurônios a frequência. A morte cerebral se fez consequência. A dúvida merecia o pior destino - era coisa daquele gênio mau, enganador, o famigerado SATANÁS - e o incauto não supôs que desse modo lhe seria acompanhante, e mais: graças à badalação dos seus sinos, ainda induziria todo o mundo às quinquilharias.
A má tese, ou a má temática, a "quantofrenia", conforme SOROKIN, ou a "aritmomania", como diz GEORGESCU-ROEGENS, condicionou o homo faber a cumprir o padrão de homo mathematicus.
Tornados nessas Regras para Direção do Espírito*, lá se vem trem da perfídia sideral, apinhado de quatrocentões. "As políticas mundiais de crescimento induzido pelo Estado tiveram exatamente o efeito oposto do que pretendiam: tinham aumentado, e não reduzido, o custo da produção de bens e serviços e tinham abaixado, e não aumentado, a capacidade das economias de conseguirem uma produção vendável." SKIDELSKY: 140. Destarte, e mercê da sucessão de coincidências, DESCARTES ainda logra a mais completa rima, atirando a humanidade na insanidade.
É uma questão que atualmente deve ser reconsiderada, tendo em vista que a fragmentação já se espalhou completamente, não apenas na sociedade, mas especialmente em cada indivído; e isso conduz a um tipo de confusão generalizada da mente, que por sua vez cria uma série infinita de problemas, interferindo com a nossa clareza de percepção de maneira tão grave a ponto de bloquear nossa capacidade de resolver a maioria deles. BOHM, David, Totalidade e ordem implicada: 17
Como insinuei, admiro a postura epicurista. Reverencio a vida estóica, mas ela não me seduz. Não quero tecer sobre o espartano, posto impróprio usar palavra de baixo-calão. A gregória cidadela não merece melhor conceito; então me escuso defini-la, para não cometer injustiça. Todavia, como mis coincidências afloram desde que pude abrir os olhos, e depois ainda soube que elas foram as responsáveis pelo meu próprio nascimento, desconfiei que todo o Universo vem ligado, até mesmo quando durmo, de modo que me é totalmente impossível augurar por qualquer alienação, por mais egoísta que prefira ser.
Se todas as partes do universo são solidárias numa certa medida, um fenômeno qualquer não será o efeito de uma causa única, mas a resultante de causas infinitamente numerosas; ele é, como se diz com freqüência, a conseqüência do estado do universo um momento antes. POINCARÉ, H., : 36
Felizmente ou não, somos atingidos por nossas circunstâncias, como magistralmente inferiu ORTEGA Y GASSET. Se não as salvarmos, não nos salvamos. Bonito, não? A tela aceita tudo, mas o desafio é tão gigantesco quanto o maior mapa que se possa elaborar: essas circunstâncias se originam nos mais remotos quadrantes, precipitando uma chuva torrencial, de maneira que é impossível das daninhas nos livrarmos.
“Há infinitos universos paralelos formando ramificações. Em cada um se atualiza uma realidade.” (TOFFLER A. & TOFFLER, H. : 20)
Nem por isso, todavia, devemos desligar os radares; e muito menos, o limpador de parabrisa.
Só conhecemos uma realidade - a dos pensamentos. Como?
Se isso fosse a essência das coisas?
Se a memória e a sensação fossem os materiais das coisas?
NIETZSCHE, O livro dos filósofos: 45
Causas e efeitos do manancial cosmológico ignoram a simplória demarcação entre passado/futuro. Isso depende do ponto do observador, apenas. À nossas contas o tempo ruge, temos prazo de validade, enquanto o Universo é grandioso, infinito, ainda que limitado. O dilema correspondente é o seguinte: ou tomamos as rédeas de nosso próprio destino, seja lá para onde se puder, ou ficaremos jogando ao léo, ao sabor das intempéries e correntes, estas sempre provocadas por alguém que preferiu a primeira hipótese.
O verdadeiro tempo (o que Bergson chama de 'duração') consiste propriamente na experiência vivencial da própria vida, e, por conseguinte, radicalmente intuitiva. Entretanto, para a maioria de nós, esse tempo verdadeiro foi inapelavelmente deslocado pelo ritmo do tempo marcado pelo relógio. Aquilo que constitui fundamentalmente o fluxo vital de experiência torna-se então um gabarito externo, arbitrariamente graduado, a que nossa existência é subordinada - e sentir o tempo de qualquer outra maneira torna-se 'místico ou louco'. Se a sensação do tempo pode ser assim coisificada, porque não haverá de ser tudo o mais? Por que não inventarmos máquinas que coisifiquem o pensamento, a criatividade, a tomada de decisões, o julgamento moral? ROSZAK, T.:230
A resposta ao dilema parece óbvia, pois. Ao abdicarmos de nossos intentos, automaticamente nos transformamos em peões desse jogo cujo rei frequentemente é suicida. E para a concretização do insólito, nenhum condottieri vacila em reduzir o semelhante ao pilhado por ROSZAK, script que oferece ao protagonista o papel de mero "autômato biológico dentro das organizações de comando e controle. A organização é o fim, as pessoas, o meio." (RIOS NETO, Antonio Sales, Complexidade e transformação organizacional: construindo novas percepções na administração judiciária sob a luz da Nova Ciência. Revista de Doutrina da 4ª Região. P.Alegre, n. 23, abr. 2008)
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Há quem tribute a incidência dos disparates ao balaio das vaidades. Ele afirma que de qualquer jeito estamos fadados ao cemitério, e dá de ombros. Resigna-se, pois, compreendendo, mas esperando que o além tudo compense. Não posso comungar. A razão da discordância é o respeito e carinho que tenho pelos que me são caros, pelos meus amigos, e por meus descendentes. Ainda que fatalmente nos encontremos em escala apenas energética, na qual a verdade estará cristalina, sem necessidade do menor esforço, ainda assim presumo que iria me sentir desertor, um elemento apartado antecipadamente das condições humanas por menosprezar nossas inumeráveis chagas e não poucas vicissitudes.
Diz o poeta que tudo vale a pena quando a alma não é pequena. Tampouco tenho a pretensão de usar a salvaguarda. Uma autoglorificação, narcista par excellence, só pode me reduzir a grão-de-areia. Neste caso, pois, nada valeria a pena. Não obstante, julgo o festejado verso em quilate descabido. Dimensões são meras arbitrariedades geométricas, inapropriadas ao tratamento atômico. O que interessa são os efeitos do átomo, e não o seu tamanho. Mas eles podem, sim, serem nulos, mormente quando isolados do campo, desconectados com aquilo que lhe empresta o valor.
A cultura medieval superior floresceu porque o povo seguia a visão da cidade de Deus. A sociedade moderna floresceu porque o povo foi vitalizado pela visão do crescimento da Cidade Terrena do Progresso. Em nosso século, porém, esta visão deteriorou-se no que foi a Torre de Babel, que está agora começando a ruir e em última análise sepultará a todos em suas ruína. Se a Cidade de Deus e a Cidade Terrena foram tese e antítese, a única alternativa para o caos é uma nova síntese. FROMM, E., Ter ou ser: 195
Não é apropriada, e nem há mérito na síntese de ter e ser. Se a premissa é falsa, seu contrário também tende ser, e por falta dupla, a síntese daí obtida nasce comprometida. Não obstante, essas categorias são complementares, por isso inseparáveis. No arbitrário delinear é que escorrem as metonímias, metafísicas provocadas pela limitação ótica e/ou interesse diversionista. E mesmo uníssonas, não garantem nenhuma eficácia. O inferno está cheio de gente que foi, e muito teve. Pois então, nem ter, nem ser. Conhecer, para usufruir e compartir: eis a matéria-prima da ética, interação que se aprimora até a despedida, até nos transformarmos em energia pura.
Mas se alguém por ventura já se vê em algum Zenith terreno, ou por aí adentrando, como sugere o parceiro comandante da nau lusitana, de que mais lhe presta a Ciência, ou o conhecimento, além do simples reconhecimento?
Imaginação! Agora sim: eis a alavanca para o sentido que melhor convém.
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Have a nice weekend.
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quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Da faina pela Ciência - Introdução

.Há muitas espécies de homens que se dedicam à ciência, nem todos por amor à própria ciência. Alguns penetram no seu templo porque isso lhes dá ocasião de exibir os seus talentos especiais. Para essa classe de homens a ciência é um esporte, em cuja prática se regogizam como o atleta exulta no exercício de sua força muscular. Há outra casta que vem ao templo fazer ofertório para seus cérebros, movida apenas pela esperança de compensações vantajosas. Estes são homens da ciência pelo acaso de alguma circunstância que se apresentou por ocasião da escolha de uma carreira. Se a circunstância fosse outra, eles se teriam feito políticos ou financeiros. No dia em que um anjo do senhor descesse para expulsar do templo da ciência todos aqueles que pertencem às categorias mencionadas, o templo, receio eu, ficaria quase vazio. Mas restariam alguns fiéis - uns de eras passadas e outros de nosso tempo. A estes últimos pertence o nosso Planck. E é por isto que lhe queremos bem. ALBERT EINSTEIN
Ponteiro lusitano formulou o tema do dia.
- Vale a pena esforço mental? De que pode servir saciar curiosidades? Por certo nenhuma fome tem fim; e como as almas não necessitam assim tanta energia, tentar uma sempre inatingível carga máxima seria, além de inóquo, um passaporte à frustração, quando não traído pelo cansaço.
Cabe-me responder as judiciosas ponderações.
De fato, qualquer atividade, se excessiva, tende prejudicar. Mas de antemão, ainda temos que enfrentar o primordial obstáculo*:
As pessoas são educadas para seguir uma carreira, e não por amor ao trabalho e à criatividade, e os partidos políticos se tornam corruptos com as contribuições financeiras do grande capital...
O valor da educação universitária não está em aprender muitos fatos, mas em treinar a mente para pensar.
EINSTEIN, A., cit. ISAACSON, W.: 513/312

As descobertas científicas de Isaac Newton rapidamente tomaram conta da sociedade, tornando-se também um modelo de vida. A sociedade aproveitou-se desse conceito, aliou-se ao poder econômico capitalista e elegeu o dinheiro como sendo o sinônimo de felicidade.
BIEHL, Luciano Volcanoglo, O mundo quântico: uma nova percepção da realidade: 16.
O próprio NEWTON usou sua chave-inglesa para entrar e assumir a Casa da Moeda!.
* * *
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Os mestres não ambicionam realização.
Sem ambição, sem expectativa.
Eles sempre estão preparados, e acolhem a todas as coisas

Tao Te King
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Apraz-me traçar minhas viagens, e assim os trechos do percurso dificilmente me são enfadonhos. Ademais, sempre logro encontrar felizes andarilhos, desses que não vislumbram algum porto seguro, ou atraente, como sóem declamar as arcaicas e capciosas escrituras.
Ela se renova, assim como as gerações, graças a uma atividade que constitui o melhor jogo do 'homo ludens': A ciência é, no mais estrito e melhor dos sentidos, uma gloriosa diversão.
BARZUN, Jacques,
cit. BERNSTEIN, Jeremy, Observación de la Ciencia. Trad. Lorenzo Aldrete. México: Fondo de Cultura Económica, 1988: 11.
Por assim me divertir, cumpre-me de plano esclarecer: não presumo que todos devam praticar o mesmo passatempo. Ademais, como bem salienta o Grande Relativo, existem muitos peregrinos de santos-de-pau-oco. No cortejo desses missionários não há diversão, mas apenas sacrifícios a duras-penas, como qualquer tributo. Pagãos de promessas! O eterno se espraia a todas direções, mas eles costumam escolher um passado, por visível. Nas mais remotas experiências os catadores juntam seus cacos do arco da velha, do tempo em que a vela era a rainha da noite, para comporem seus patchworks. Por paradoxo, quanto mais se atém nos fatos pretensamente racionais, porque "provados", ou coincidentes com suas aspirações, mais os mosqueteiros se distanciam da emergente realidade:
A informação proporcionada pela experiência histórica não pode ser usada como material para a construção de novas teorias ou para a previsão de acontecimentos futuros.
MISES, Ludwig von, Ação Humana - Um Tratado de Economia: 72
Sob tal prisma, nem eu nem ninguém pode ser dono-da-verdade. E se ela já fosse predisposta, instalar-se-ia através de tantos pontos quantos são os átomos que compõem a estupenda teia universal. Impossível alguém disso tudo se apropriar, embora em parte, ou precariamente, feito andaime, algum felizardo possa detê-la. Dessarte não tenciono aliciar, imprimir o proselitismo às ciências. Todavia, tirante aquelas funções mais elementares, francamente: a civilização deveria mesmo parar imediatamente com tudo que faz, para se dedicar a encontrar melhor razão ao que faz:
Este novo mundo pode ser mais seguro se for
informado sobre os perigos das doenças dos antigos.
DONNE, John, An anatomic of the world -
The first anniversary (1611). -
cit. SAGAN, C., Bilh
ões e bilhões: 84.
A visão materialista estabelece: mais dinheiro=vida melhor. Porém, tendo adquirido mais e tendo descoberto que o vazio permanece, a conclusão da premissa materialista está errada.
ARNTZ, W.: 30
Essa "novidade" nasceu há século, no estábulo E=mc2. Se a matéria é apenas expressão energética, o materalismo não tinha, como não tem, qualquer objeto!
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*Tradução do quadro:
Onde o mundo cessa de ser a cena dos desejos pessoais, onde encararmos a liberdade dele ser, admirando, perguntando e observando, lá nós incorporamos o reino da arte e da ciência





terça-feira, 24 de novembro de 2009

O Périplo

O cientista não é um ser que vive à procura da glória ou do sucesso e a evitar o fracasso. Sob esse aspecto, vejo o cientista como um ser que abre ou fecha portas. Se nada de minhas teorias se justificar, gostaria de passar para a história da ciência como alguém que colaborou para que se fechasse a porta de um labirinto imenso e que não dá em lugar nenhum. Psicologicamente falando, isso me basta.
THOMAS KUHN.
Embora ao presente recaia a urgência de melhor calibrar o futuro, dedico meu esforço, de modo especial, à memória daqueles entes queridos aparentemente invisíveis..
Dessarte, desdenho exatidões.
.Confiante nas probabilidades oferecidas por algumas simples, mas revolucionárias premissas científicas,
estendemos as velas, e assim zarpamos rumo aos
mares "nunca dantes navegados".
Quem quer passar além do Bojador
Tem que passar além da dor.
Deus ao mar o perigo e o abismo deu,
Mas nele é que espelhou o céu.
FERNANDO PESSOA
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Valeu o risco não calculado. No beneplácido, mas igualmente contando com o perdão lusitano: se viver não é preciso, navegar também não requer sê-lo - bastam aproximações.
A busca de segurança é uma ilusão. Para a tradicional sabedoria ancestral, a solução deste dilema está na sabedoria da insegurança, ou na sabedoria da incerteza. Isso quer dizer que a busca de segurança e de certeza é na verdade, um apego ao conhecido. E o que é ele, afinal? O conhecido é nosso passado. O conhecido nada mais é que a prisão dos velhos condicionamentos. Não há nenhuma evolução nisso - absolutamente nenhuma. E quando não há evolução, há estagnação, desordem, ruína.
CHOPRA, Deepak, As Sete Leis Espirituais do Sucesso: 77
As peripécias dos eletrons, esses beatles orbitais, garantem o equilíbrio nuclear à ecologia, à vida na Terra, e tudo mais.
Nossa penetração no mundo dos átomos, antes vedado aos olhos do homem, é de fato comparável às grandes viagens de descobrimento dos circunavegadores... Essa descoberta, com efeito, gerou uma novíssima base para que se compreenda a estabilidade intrínseca das estruturas atômicas, a qual, em última instância, condiciona as regularidades de todas experiências corriqueiras.
BOHR, N., Física atômica e conhecimento humano: 30
No meio dos cruzeiros, os TriPulantes MORIN, (Contrabandista dos saberes, cit. PESSIS-PASTERNAK: 86) e FOUCAULT, (Microfísica do Poder: 5) reconheceram a dificuldade da missão:
Tudo o que é humano é ao mesmo tempo psíquico, sociológico, econômico, histórico, demográfico. É importante que esses aspectos não sejam separados, mas concorram para uma visão 'poliocular'.

O problema é ao mesmo tempo distinguir os acontecimentos, diferenciar as redes e os níveis a que pertencem e reconstituir os fios que os ligam e que fazem com que se engendrem, uns a partir dos outros.
Saudade é buraco-negro. Mister uma supernova.
Cumpridas milhares de escalas, devidamente relatadas num milhar de approaches, ora vislumbro a reentrada na atmosfera. Um sutil azul transporta a inesgotável energia cósmica. Colho o ensejo: por ela venho surfando. Raios de luz recocheteiam na água, beijam a escotilha, e assim balizam o procedimento de touch-down..
A Nave fica em exposição pública, aberta 24 hrs, repleta de delícias......,Algumas fontes pesquisadas
Auguramos lhe manter cativo por long time ago. Desfrute.
Vasculhe seus aposentos. Em cada
suíte, uma surpresa.

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quarta-feira, 11 de novembro de 2009

Epílogo

Encha sua taça até a borda
E ela transbordará.
Afie constantemente sua faca,
E ela ficará sem fio.
Persiga dinheiro e segurança,
E seu coração jamais se abrirá.
Preocupe-se com o aplauso das pessoas,
E ficarás prisioneiro delas.
Execute sua obra; e então, retire-se.
Este é o caminho para a serenidade
TAO TE KING.
,
,


.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

A inexorabilidade da verdade




Você tem paciência para esperar,
Até que a lama se assente e a água fique límpida?
Você consegue ficar imóvel,
Até que a ação certa ocorra espontaneamente?
TAO TE KING.
Para lograr o invejado status que supõe glorioso, o transgressor não vacila em abandonar a trilha da virtude, se é que por algum momento lhe avistou. Se a carência de altivez não preocupa o criminoso mais comum, que se dirá do corrupto?  O covarde age à traição. Vale-se de ordinárias fraudes, vulgares falsidades. Mistura-se na multidão, ou sob a capa do partido  para perpetrar sua má intenção. Qualquer recurso serve para superar ou liquidar virtual opositor.
Se pudéssemos retirar a cobertura turva da antiguidade e rastrear o princípio de suas origens, não encontramos nada melhor que o principal rufião de alguma quadrilha turbulenta cujos modos selvagens ou a astúcia superior lhe valeram o título de chefe entre os saqueadores e que, ao aumentar seu poder e estender o campo de suas depredações, intimidou as pessoas pacíficas e indefesas a comprar sua salvação em troca de tributos freqüentes. A pele não mudou nem com o tempo.  PAINE, T.,  Common Sense,. - The Complete Writings of Thomas Paine, P. Foner, ed. New York: Citadel Press, 1945, vol. 1: 13
Engana-se, todavia, em buscar desse modo o esplendor. Só alcança fracasso, ao invés do êxito que desesperadamente almeja. Ainda que logre atingir a meta estipulada, sempre se decepciona miseravelmente com a felicidade que acredita poder nela saborear..Jamais supõe o incauto que a cada virtude e a cada vício a natureza oferece precisamente a recompensa ou o castigo mais adequado para encorajar aquela, e refrear o outro. Em flagrante, nega, mas chora, copiosamente. A honra de sua elevada posição aparece tanto a seus próprios olhos quanto aos demais, corrompida e maculada pela baixeza dos meios pelos quais ascende. Faz-se digno de pena. É o que tencionam as lágrimas, quando cai a máscara. Até o instante fatal, o crápula presume não ser pego em flagrante, mas o fantasma lhe aterroriza. Como rato, sói encontrar alguma sombra para esconder sua pouca vergonha, mas lembra-se do que fez, e essa lembrança lhe diz que outros também lembrarão. Atormentado, procura invocar os obscuros poderes do esquecimento, aninhando-se em recônditos que julga de seu conforto, seja na venal e vil adulação dos parceiros, entre eventuais inocentes e mais que tolas aclamações populares, ou em ninhos de ricaços, famosos e sabidões. Secretamente, todavia, sofre a perseguição incessante e retaliadora da fúria do remorso. A glória que parecia lhe abraçar a vê distante pela própria imaginação aviltada. A negra e podre realidade que compôs retorna com força dobrada em sua direção, pronta a atacá-lo também pelas costas, justamente de acordo com seu predileto costume. Tanto quanto SHAKESPEARE, ele bem entende:
Para negócio assim, que é só maldade, qualquer traição é honestidade.
Maquiavel, o diretor da peça original, programou-a sem margem a maior variação. O sádico renascentista reservou um final melancólico, geralmente trágico, ao seu astro principal, justamente ao deleite da platéia. Ela é quem lhe garante a bilheteria.

sábado, 7 de novembro de 2009

Dos obstáculos epistemológicos *


Durante seu desenvolvimento pelo pensamento grego, a filosofia da natureza enveredou por um caminho equivocado. Esse pressuposto errôneo é vago e fluído no Timeu de Platão. WHITEHEAD, Alfred North: 31
Durante longo tempo o ideal do conhecimento científico foi aquele que Laplace havia formulado com sua idéia de universo totalmente determinista e mecanicista. Segundo ele, uma inteligência excepcional dotada de uma capacidade sensorial, intelectual e computacional suficiente poderia determinar qualquer momento do passado e qualquer momento do futuro. É essa visão pueril e talvez louca do mundo que está prestes a desmoronar, mas ela ainda reina, e efetivamente excluiu todo o problema da reflexividade. MORIN, Edgar 2000: : 32
O homem que descobre uma nova verdade científica precisou, anteriormente, despedaçar em átomos tudo o que aprendera, e chega à nova verdade com as mãos sujas de sangue do massacre de mil superficialidades.
ORTEGA Y GASSET, cit. ROHMANN, C.: 298
Confesso a má-educação. Já na infância fui convencido ser portador de dupla personalidade: um de meus polos volta-se ao divino, por causa da natureza da alma; por outro lado, tenho que me precaver contra os apelos de meu corpo, este mundano. E pelo fato do mais antigo ancestral tê-la desconsiderado, eu suaria a testa para sobreviver.
O desígnio do trabalho vem do próprio latim, tripaliare., Significa tortura através de um instrumento chamado tripalium.“Na concepção cristã, o trabalho representava o pagamento do pecado, um ato de expiação que sugere necessidade, aflição e miséria.” (ROHMANN, C.: 122)
Para cumprir a obrigação, manter meu corpo, até mesmo diante dos meus semelhantes, cruéis e desumanos irmãos terráqueos, mister encher minha mochila com band-aids. Assim é que em vez de sonhar e brincar, consenti em decorar díspares fórmulas, alcunhadas disciplinas, para que pudesse usá-las quando crescesse, ou seja, para depois de uns dez anos. O presente deveria ser empenhado em prol da  futura responsabilidade pessoal e social.
Na longa viagem uma questão me vinha à mente: porque deveria adotar tantas medidas preventivas, especialmente em função dos lobos? De que serviam as leis? Por humanas, elas também não conteriam alguma alma, algum espírito, além das meras intenções utilitárias?
Abri o título, e nada encontrei; apenas mapas de como são feitas. Segui adiante. A porta da frente acolhia interessados, mas para tanto teria que esvaziar minha mochila. As quinquilharias que carreguei por anos a fio de nada teriam serventia. Matemática? Física? Química? Biologia? Isso tudo era peso-morto. Ademais, partes das peças restantes teriam que ser cortadas, por inúteis.
Resignado, sentindo-me já quase um idiota, não me restava alternativa. Embarquei no novo trem, cuja viagem demandaria no mínimo mais cinco anos sacrificando boa parte de minhas noites de festas, os jogos lúdicos, meu violão e a poesia, meus parcos recursos, e a convivência com meus pares, na promessa de que o destino me traria tudo de volta, e multiplicado. Bem já sabia que isso não era verdade - o tempo per se nos dissipa - mas a pressão social nos obriga seguir.

No longo percurso encheram minha mochila com o que era considerado de valor, mormente especiarias de tal Império Romano. Aprendi belos truques, mas entre os meandros e filigranas, ecoava o mantra da minha primária questão. No último dia deram-me a certidão - apto ao trabalho - e deram-se cumpridos à missão. Ora, para isso, para ganhar a vida com meu suor já estava pronto, e até praticando, há muito. E, francamente, já constatado no meio, pouco me adiantaria "vencer" na vida.

O que se cumpria pois, era muito além de meu vaticínio: não obstante ter empregado a infância, boa parte de minha juventude, e não pouco dinheiro, recrudescia minha interrogação, agravada de outra: o que significa Justiça?
Nova portaria insinuava que os preceitos poderiam ser aproveitados, desde que me dispusesse a colar as peças em forma de puzzle. Isso naturalmente demandaria uma nova viagem, desta feita mais curta. Supus que nos tres anos pudesse divisar as duas faces da moeda que eu procurava. Desta feita o Estado me pagaria o ticket pelo meu sacrifício de mudar de cidade, de amigos, deixar mulher e filhos vendo novelas e navios, enquanto eu tentava na noite vislumbrar algum clarão. Empenhado o novo tempo, o locutor anunciou:

Esvaziem completamente suas mochilas. Estão repletas de obsolências, enganos, ideologias, ficções, artificialismos, parcialidades, dogmatismos e presunções. Nada disso corresponde à ciência. As exatas ministradas na juventude não são fidedignas, e as humanas beiram à desumanidade. Nenhuma lei tem espírito, exceto a vontade do legislador escolhido pela sociedade. Portanto, os ordenamentos são tão variáveis quanto as circunstâncias nas quais visam se impor, de maneira que a bagagem não tem a menor serventia.
E logo me veio outra razão:

O esforço natural de cada indivíduo para melhorar suas própria condição constitui, quando lhe é permitido exercer-se com liberdade e segurança, um princípio tão poderoso que, sozinho e sem ajuda, é não só capaz de levar a sociedade à riqueza e prosperidade, mas também de ultrapassar centenas de obstáculos inoportunos que a insensatez das leis humanas demasiadas vezes opõe à sua atividade.
SMITH, A.
cit. DOWNS: 56
Se desconfiara de minha péssima educação, um ministério para bobo partido em incontáveis fatias, apenas arbitrariedades, cacos de composições fantasmagóricas, completamente desconectadas da realidade, mas perfeitas ao sabor do feitor, agora lograva a mais completa certeza.
A visão materialista estabelece: mais dinheiro=vida melhor. Porém, tendo adquirido mais e tendo descoberto que o vazio permanece, a conclusão da premissa materialista está errada. ARNTZ, W.: 30
Vá lá - antes tarde, do que nunca. O quê de melhor, ao cabo, aprendi:

É uma questão que atualmente deve ser reconsiderada, tendo em vista que a fragmentação já se espalhou completamente, não apenas na sociedade, mas especialmente em cada indivído; e isso conduz a um tipo de confusão generalizada da mente, que por sua vez cria uma série infinita de problemas, interferindo com a nossa clareza de percepção de maneira tão grave a ponto de bloquear nossa capacidade de resolver a maioria deles.BOHM, David, Totalidade e ordem implicada: 17
“Um conhecimento mais profundo é sempre acompanhado de uma abundância de razões coordenadas.” (BACHELARD, G., A filosofia do não: 21)
Resta-me o conforto:

A inteligência prolongada da natureza e do ecossistema, a grante teia da vida, também trabalha através da coincidência e do sincronismo, como o faz a inteligência fundamental do universo. CHOPRA, DEEPAK, 2005: 90
O Universo se vê integrado, e por isso fronteiras são inoportunas, demodè. Não se contém um óleo derramado no oceano, tampouco o gás de Chernobyl. As asas da borboleta sub-equatorial podem fazer chover na Califórnia. O roubo num banco americano deflagra a crise mundial. Não há lei capaz de preservar o tempo; tampouco a  Amazônia.
A partir daí, passei encarar a hipocrisia ao largo. Dedico-me em périplo individual, sem destino pre-estipulado. Antes, todavia, convocado por ORTEGA Y GASSET, retornei àquelas ilusórias bases, no fito de detoná-las, para que não atraiam meus descendentes. Orgulho-me dos crimes cometidos contra os obstáculos epistemológicos: dezenas de exumações, em ataques ininpterruptos; porém, nem uma gota me caiu nos dedos. Ao mirar a obsoleta arquitetura das oxidadas plataformas jurídico-econômicas criadas e institucionalizadas pelos ocidentais, apelei apenas por bisturis demistificadores, a laser, (light amplification by stimulated emission of radiation), à primordial profilaxia, aragem preparatória ao plantio de um novo tronco, suficientemente oxigenado, um sustentáculo efetivo, motriz de um desenvolvimento "humano e sustentado".
Taxeando com a lente holística (abrangente da totalidade, somatório de disciplinas, apreciação globalizada), invadi pela aparelhagem do Estado. Deparei-me com mirabolantes criações, elucubrações provenientes do acúmulo de ilusões, artifícios da centelha acesa por PLATÃO, e oferecidos como dísticos científicos, por isso pretensamente lógicos. Ei-los pacientes do corte epistemológico (do grego episteme - saber ou ciência), e até do costume, porque para onde são estendidos esses trilhos só se chega à beira de penhascos.
A mudança para um humanismo congraçado com a natureza, por isto mais sensível, solidário, e complementar, mostra-se tarefa inadiável, porém se faz prazerosa, envolvente, natural, facilitada ainda, pela conscientização disseminada.
O imperativo da melhor convivência do habitante com seu meio ambiente não pode olvidar, por óbvia extensão, o semelhante. Isto condiciona, pois, o aprimoramento das relações pessoais; por conseguinte, sociais. Em outras palavras: pelo respeito e consideração ao indivíduo (só por ele), chegamos ao resultado social e, por consequência, ecológico. Onde isto se ensaia, quando prolifera esta idéia que a todos convém, a economia é considerada apenas expressão numérica, não hegemônica; e a lei, explicação. O desiderato se impõe independentemente de números ou códigos comportamentais (posto que infinitamente mais amplo), mas se faz também legal e legítimo, cientificamente correto e apreciado, em reversão por convergência, sem dialética, mas por somalética, dialógica pela qual a ética não se fratura.
“De fato, a vida no espaço cibernético parece estar se moldando exatamente como Thomas Jefferson gostaria: fundada no primado da liberdade individual e no compromisso com o pluralismo, a diversidade e a comunidade.” (NAISBITT: 96)
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* É aí que mostraremos causas de estagnação e até de regressão, identificaremos causas da inércia às quais daremos o nome de obstáculos epistemológicos (...) o ato de conhecer dá-se contra um conhecimento anterior, destruindo conhecimentos mal estabelecidos, superando o que, no próprio espírito, é obstáculo à espiritualização.
BACHELARD, G., 1996: 17
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Aprecie:
A razão do conhecimento